[RP FECHADA] LOST

Os olhos de Daaren passearam rapidamente por um mercador de olhar malicioso, tão penetrante que chegou a ser desconfortável. Viu-o furtar de um cliente tão rápido que Daaren considerou sorte ter conseguido ver toda a ação. Desonestidade. Era algo que não costumava perdoar. Mas não estava com tempo ou paciência para interferir na vida de terceiros - a humanidade sempre fora assim e continuaria até os fins dos tempos. Pena.

Continuou caminhando, e parou sobre uma barraca de venenos e poções que vendiam abertamente numa praça. Achou estranho, mas tampouco ruim. Talvez apenas não estivesse acostumado com a ideia de viver em uma cidade tão estranha quanto aquelas que vinha visitando. Enfim, não chamar atenção parecia uma tarefa impossível quando vestia-se daquele jeito. Embora fosse, de fato, chamado de "Vermelho", sua customização característica incluía uma capa longa e negra, pois achava a cor original dos sacerdotes viva demais. Chegou a incomodar alguns guardas, pois parecia algum tipo de assassino ou figura procurada, mas não passava de um sacerdote.

— Se não vai comprar, suma daqui! — Um mercador respondeu mediante a falta de dinheiro de Daaren, que apenas lançou-lhe um olhar perfurante, mas que se retirou minutos depois, respirando fundo. Dinheiro. Era algo tão desnecessário em Asshai... Os servos do templo e os adoradores sempre deixavam alguns trocados para que o mesmo fosse mantido, e Daaren usava-os para se alimentar e alimentar os outros membros do templo.

Ali não recebia tal tributo. Era um sacerdote com fome.

Daaren respirou fundo. Tinha algumas poucas coisas que havia aprendido a fazer em sua vida, e uma delas era tirar proveito dos desejos dos outros. Com certa calma, achou um beco entre duas residências. Havia um varal com algumas roupas carentes de pano penduradas ao fundo, e piscou algumas vezes antes de pensar em mexer nele. Observou o fluxo da praça central e viu que não poderia roubar uma roupa sem ser visto, mas pra ser sincero, estava pouco preocupado. Contando com a vantagem de ser um beco escuro, e mantendo-se atento, esgueirou-se o mais silenciosamente possível e furtou o que era uma calça bem curta e um echarpe para usar ao redor do pescoço.

Retirou as próprias roupas e vestiu as "novas", pegando um roupão um pouco mais longe e cobrindo o corpo com o tecido. Estava quase praticamente seminu, se não fosse pelo roupão, mas precisaria daquilo para fazer algum dinheiro. Deixando as vestes de sacerdote negras para um mendigo, já que tinha mais milhares daqueles panos em sua pequena casa alugada, Daaren foi em direção à um bordel bem conhecido em Volantis e ficou próximo, mas não perto o suficiente para ser pego pelo dono da propriedade.

Ficou quieto, e aguardou. Por volta de meia hora, Daaren ficou próximo de outro beco à oportunidade de achar alguém que se interessaria pelo que tinha a oferecer, embora na verdade tal coisa estivesse fora de questão. Esperou. E um homem magricela, bem mirrado, passou por onde estava o sacerdote e encarou-o. Era sua deixa.

Daaren observou o homem que apareceu na sua frente como se fosse um mero pedaço de carne. Tirou o echarpe do pescoço e, bem lentamente, repousou as mãos sobre o roupão para poder abri-lo. Exibiu metade do peitoral para o homem, e voltou a se cobrir quando conseguiu chamar sua atenção. Viu-o andar com certo interesse em sua direção, e Daaren exibiu um sorriso cínico. — Quanto cobras pelo programa, prostituto?

O tom insultou Daaren - não gostava de fazer o que fazia, mas precisava, então passaria por quem quer que fosse. Ser chamado de prostituto era quase um insulto para um sacerdote como ele, que sempre preservara o corpo para o seu Deus. Apesar de tudo, tentou manter seu disfarce.

— Sou uma atração à parte deste bordel. — Disse, e com um meio-sorriso malicioso, se aproximou do garoto. Ele era menor do que parecia, a proximidade obrigou Daaren a ter de olhar para baixo para manter o contato visual. — Mas isso não significa que serei barato. Não... Muito pelo contrário. Nunca mais irás me encontrar por aqui.

Aquilo não despertou interesse. Mas a mão que Daaren deslizou pela cintura do homem, sim.

— Não tenho muito dinheiro. — Disse.

— Me contentarei com o que tens. — Respondeu. A ideia de pagar pouco foi ainda mais convidativa.

Daaren puxou o homem para o beco, e mantendo seu meio-sorriso, se despiu do roupão. Estava em um canto escuro - aquele homem tinha todas as razões para desconfiar que o sacerdote iria fazer algo mal à ele. Mas não fez isso. Apenas acatou. Sentindo certa pena, manteve seu jogo por um pequeno período de tempo. Beijou-o. Sentiu o gosto de rum na língua, e odiou. Deixou-o deslizar a mão por seu corpo e, entre outras coisas, retribuiu.

Quando achou que estava indo longe demais - o homem com o rosto próximo de sua virilha, mas Daaren ainda usando sua calça -, o mesmo segurou seu alvo pelo queixo e sorriu-lhe. — Você é demasiadamente ingênuo. — Disse. As pupilas de Daaren, então, dilataram como as de um felino. Era bonito, mas amedrontava quem não conhecia a magia, e era algo estético, inofensivo - um pequeno truque que aprendera em Asshai com sua mestra ao ser iniciado na magia de R'hllor.

Fechou o punho e deu um soco forte no queixo do homem. Sua intenção era nocautear, mas devido sua pouca força, foi preciso ainda mais um para deixá-lo inconsciente. Daaren vestiu o roupão que havia deixado cair no chão e vasculhou a bolsa de moedas de seu alvo. Como previsto, apenas alguns veados de prata, o que era o suficiente para poder comprar comida e se manter por mais alguns dias antes do próximo navio de mercantes zarpar.

Daaren saiu do beco com uma expressão indiferente, como se nada tivesse acontecido, e com certa calma começou a andar em direção do distrito comercial para fazer suas compras. Apenas mais um dia nas Cidades Livres.

Spoiler:

Daaren pretendia seguir em frente, mas foi impedido ao notar que alguém o observava. Hesitação foi a primeira coisa que sentiu. Se alguém o identificasse, poderia ser entregue aos guardas. Isso era um problema que pretendia evitar. O sacerdote resolveu cobrir o rosto com o echarpe para não ser identificado, mas o simples fato de ter os olhos puxados o entregava facilmente.

Um segundo olhar na moça fez Daaren arregalar os olhos. O rosto dela - tinha a visto morrer numa visão. Um rosto familiar demais.

Não acreditou. Ficou por aproximadamente um minuto inteiro avaliando a moça que o observou, não se importando com o quão desconfortável poderia ser aquela situação - era como se tivesse visto um fantasma. Não estava enganado. Aquela era Primeira, a melhor amiga de Daaren e ex-escrava de Cassim.

Daaren começou a andar em sua direção. Tirou o echarpe do rosto. Confirmava que era ela ao se aproximar ainda mais, esperando que ela também o reconhecesse.

— Primeira. — Não se conteve. Ao chegar próximo o suficiente, quase se jogou contra ela - lançou os braços pelo pescoço da garota, que agora era adulta, e a apertou com força. Lembrou-se momentaneamente do momento em que a conheceu - o quanto ela falava sobre ter saudades de algo ou alguma coisa. Daaren sentia isso agora mais do que nunca. Saudades da mulher que o ensinou a ser livre. — O que diabos você está fazendo em Volantis? — Disse. Mas não se soltou dela. A abraçava no meio do fluxo de pessoas.

— Eu não achei que ia te ver de novo. O que andou fazendo? Está tudo bem? — Disse, após uma longa pausa. Ao se afastar, fitou-a fixamente. Daaren estava com os olhos marejados, mas ao mesmo tempo exibia um sorriso genuíno.