[RP Fechada] But I'm just a girl...

A noite havia chegado à Ilha dos Ursos e, com ela, os ventos frios que teimavam em submeter o castelo à queda de temperatura. Nos aposentos de Elyria, Odelia encontrava-se sentada à mesinha de leitura da nobre, debruçada sobre um livro imenso e velho. A Jovem Ursa estava mais à vontade, esparramada na cama como se estivesse sozinha. Sabia que deveria se portar mais adequadamente frente à serva, mas a amizade entre ambas já era forte o suficiente para que a Mormont pudesse se mostrar como era de fato, sem sua caracterização natural que assumia no dia a dia. Na verdade, Odelia tinha um carinho tão grande pela jovem que quase a considerava como uma filha, ao invés de como sua lady.

- Hipérico? - Para dispersar o ócio, as duas mulheres faziam um jogo de forma a embasar ainda mais os conhecimentos de Elyria. Enquanto Odelia examinava o livro atrás de plantas e suas descrições, a nobre precisava lembrar o que já sabia a respeito do que a serva perguntava. A Jovem Ursa vinha acertando com uma facilidade enorme, mas não sabia se realmente possuía tal conhecimento ou se a mulher com o livro vinha lhe permitindo "ganhar". Deitada na cama, Lady Mormont pensou, o rosto se contraindo enquanto se esforçava para buscar as informações em sua mente.

- Hipérico... É conhecida como uma planta mágica, por conta de suas inúmeras funções. Possui significados místicos, aparentemente tendo o dom de expulsar espíritos maléficos e o azar. - As lembranças lhe faltaram e ela se sentou na beira da cama, os olhos confusos a encarar as costas de Odelia. O que o hipérico era capaz de fazer? A frustração se apropriou da morena, uma vez que ela odiava falhar em seus estudos, fosse por qualquer motivo. Levou as mãos ao rosto, fechando os olhos na tentativa de recuperar o fiapo de consciência a respeito de herbologia que parecia estar ali, a pouca distância dela, mas não obteve sucesso. Fechou a mão direita com força, deixando-a cair sobre a cama, as unhas forçando a carne da palma, produzindo uma espécie de dor aguda, mas suportável. Aquela era a punição de Elyria. Era daquela forma que ela se forçava a aprender o que precisava. A serva permanecia de costas para ela, ainda esperando a continuação da resposta ou distraída demais à procura da próxima pergunta do jogo. A dor continuou até que a nobre mordeu os lábios, voltando a abrir a mão, as marcas vermelhas destacando-se frente à pele pálida. - Não me recordo do resto. - Odelia virou-se, assombrada, ao ouvir a voz gélida da moça que parecia tão animada anteriormente. Fizera menção a abrir os lábios, mas Elyria a silenciou com um olhar. - Relembre-me ou deixe meus aposentos. - A mais velha assentiu, folheando o livro.

- Quase todas as partes do hipérico podem ser utilizadas. É um arbusto que atinge até cerca de 80 centímetros de altura, aromático, mas de sabor amargo. As flores possuem coloração amarela e devem ser colhidas logo que desabrocham, junto às folhas mais próximas... - A serva parou, respirando fundo e rápido, antes que irritasse Elyria, mas a Mormont interferiu.

- Posso continuar daqui. - Os olhos de Odelia se voltaram para ela, que permaneceu sem expressar resquício algum de humor. - Podem ser maceradas, de forma a adquirir a consistência de pó, enquanto as raízes devem ser utilizadas por inteiro, sendo fervidas em água de forma a preparar uma infusão. Possui propriedades tranquilizantes, cicatrizantes, age contra inflamações e contra problemas intestinais. Dependendo da dosagem, é capaz de conceder sono profundo. Faz uma verdadeira limpeza no organismo. - Finalizou, os olhos voltando-se para o chão antes de captarem a expressão orgulhosa da serva. O fracasso ainda era amargo e ela precisava ser capaz de contorná-lo. Podia ser algo bobo, visto por outras pessoas, mas Elyria dava o máximo de si em qualquer assunto, mesmo que fosse algo tão banal como o clima nortenho. Não tolerava deslizes.

Odelia encheu-se de tristeza, levantando-se de sua cadeira e deixando o livro em cima da mesa. Preferiu abandonar os aposentos por alguns minutos, em busca de algo que melhorasse o humor da Mormont, do que cogitar confortá-la e receber imenso descaso e frieza. No fim das contas, conhecia a garota como se fosse de seu próprio sangue.

habilidade treinada:

Odelia voltou a adentrar os aposentos de Lady Mormont com uma pequena caixa dourada em mãos. Aproximou-se da jovem, permanecendo em pé à sua frente, enquanto Elyria permanecia sentada na cama, os olhos agora fixos na caixa, a curiosidade dominando-a. Deu de ombros, como se incentivasse a serva a discorrer sobre o que acontecia ali, sentindo uma pequena pontada de ansiedade. Odelia suspirou antes de começar a falar.

- Antes de chegar à Ilha, em minha longa viagem de exílio, pude descansar em uma casa dornesa. A dona do lugar era extremamente aberta a falar de tudo, o que admito que me deixava corada com frequência. No entanto, ela disse que eu não tinha do que me arrepender. Fiz o que fiz por amor, e esse sentimento é o maior motivador que existe. - A Ursa bufou, jogando-se na cama. Não queria uma lição de moral da mulher, apenas queria poder digerir seu fracasso em paz. Mas a mais velha não desistiu, ajoelhando-se ao lado da cama de forma que pudesse ficar à altura de Elyria. - Eu vejo esse amor em você, Mormont. O amor ao conhecimento, a sede pelos livros. Mas peço a você que não permita que ele lhe devore, milady. Todos erram, alguns com grande constância. Mas você... Você erra, reconhece e procura melhorar. Quer dar o que tem e o que não tem para ser lembrada. Isso pode ser perigoso, se levado ao extremo. - A caixa foi aberta, de forma que Elyria se apoiou sobre um dos cotovelos para observar seu conteúdo, enfurecendo-se com o que via.

- SEMENTES SECAS?! - Os olhos fixaram-se nos de Odelia, a raiva preenchendo-a quase a ponto de não mais caber no corpo juvenil. A serva deu de ombros e abriu um sorriso provocador.

- Sementes de psyllium, minha senhora. Foram dadas a mim pela senhora dornesa, agora são suas. Por estarem secas, não servem mais para nada, mesmo que tente utilizá-las. Servem apenas para lembrar à senhorita que o fracasso acontece, mas você pode aprender a conviver com ele. Às vezes, não há mais nada a ser feito. - A serva levantou-se, colocando-se novamente sobre os pés, mas a caixa foi deixada sobre o colchão. Elyria parecia confusa, a raiva fervendo dentro de si, mas a compreensão irrompendo aos poucos, permitindo que ela respirasse fundo antes que falasse alguma besteira.

- Deixe-me, por favor. - Odelia virou-se para a porta, mas não havia chegado até ela quando a Mormont pareceu entender. - Obrigada pela companhia. - Fazendo uma reverência de costas, a serva saiu, deixando a jovem imersa em pensamentos.  


Encoberta pelas sombras do castelo, a lady vagava pelos corredores. Conhecia seu lar como a palma de sua mão, motivo pelo qual não precisava de uma tocha para guiar-se. Mesmo que não enxergasse na escuridão, lembrava perfeitamente dos caminhos traçados e objetos que podiam atrapalhá-la em sua movimentação. Não sabia o que procurava, só queria não precisar ficar em seus aposentos. Com isso em mente, andou sem rumo até que um clarão lhe chamou a atenção, vindo de uma das escadas, sinal de que alguém possuía uma tocha por ali.

Elyria admitia que sua curiosidade era gritante. Não era capaz de segurar-se, o que a fez esgueirar-se para que acompanhasse a claridade do fogo.

Desceu as escadas, com a máxima distância possível para que não fosse identificada, mas que mesmo assim, ainda pudesse ter a luz em seu campo de visão. Procurou ficar descalça, deixando os sapatos que antes cobriam seus pés em um dos degraus, a fim de que pudesse tornar toda a espionagem o mais silenciosa possível. Era difícil manter os pés descalços no chão gelado sem que reclamasse, mas esforçou-se para que a concentração se desviasse ao seu objetivo, seguir o desconhecido.


Finalmente. A Ursa estava onde devia estar. Pelas frestas da porta, podia ver a luz que emanava de dentro da sala, mas não via outra maneira de entrar que não fosse pela própria porta da frente. Deu de ombros, era autoridade ali. As mãos delicadas empurraram a porta de madeira bem a tempo de ver alguém que cortava a própria mão, de costas para ela. No entanto, a Mormont reconheceria aquela silhueta em qualquer lugar, confirmando suas suspeitas quando Rodrik se virou para ela, o rosto sereno a formar um sorriso.

- Ora, ora... Eu já esperava por você. O Senhor da Luz nunca me desapontou em minhas orações. - Elyria sentiu-se arrepiar apenas por ouvir as palavras do homem. Ele sempre estivera ali para ela, como podia seguir a Fé Vermelha e ela nunca ter descoberto? Inconscientemente, deu um passo atrás, a mente lhe dizendo para correr.

- Você nem mesmo tentará negar? - Rodrik riu, sua mão fechando-se, fazendo com que duas gotas escarlates pingassem no chão.

- Até onde eu sei, proferir minha fé nunca foi um crime, milady. Mesmo que ela não corresponda à sua. - Ele largou a faca que usara, aproximando-se da Ursa, que permanecia paralisada pela visão de seu amigo ali, servindo a R'hllor. O homem passou uma das mãos pelos ombros dela, conduzindo-a para dentro da sala e deixando uma marca ensanguentada em suas vestes de sono. - Devo dizer que eu sempre tive planos para você. Mesmo quando era uma menina aterrorizada pela falha crítica que levou à morte de um animal. - A porta bateu, deixando a jovem presa com Rodrik. Não conseguiria fugir, mesmo se quisesse. - Minhas intenções nunca buscaram seu mal, milady. Visavam prepará-la para o que virá. O inverno se aproxima, mas o fogo é ainda mais claro do que antes. R'hllor protegerá os seus. Eu vi em você o tipo de coisa que quero proteger. Pedi por sua proteção ao meu Senhor. - Elyria piscou como uma criança que acabara de receber um sermão e não entendia o motivo da raiva dos pais. Estava confusa e chocada.

- Não entendo... O que está dizendo? - O servo puxou uma cadeira e indicou que a moça sentasse, o que foi obedecido com rapidez. Ela estava em poder dele, não sabia o que podia acontecer caso apresentasse desobediência.

- Será uma longa noite, milady. Que o Senhor da Luz a ilumine.