[RP Aberta] Days' Work

O graveto disposto sobre a fogueira girava conforme a intensidade do movimento realizado. O salmão recém-capturado, perfurado verticalmente, já exalava um saboroso odor que aguçava as papilas de Will. Seu estômago lembrou-o dos longos dias em que sobrevivera apenas de sua escaça cesta de frutos, restando-lhe, agora, uma estreita fatia de maçã e algumas unidades de uma curiosa fruta roxa, presente de uma camponesa que o aliviara por uma noite.  Suas percepções o indicaram que o peixe não estava totalmente assado, assim que o abocanhou. A fome, porém, calou-as. Ainda estava saboreando do doce sabor impregnado em seus dentes quando os passos arrastados o alertaram. Pisoteou as brasas de forma rápida e silenciosa, deixando seu abrigo entre as árvores em plena escuridão. Agarrou um pequeno graveto e colocou-o sob a proteção de sua camiseta, fazendo-o assumir uma questionável semelhança com uma adaga.
- Ouço seus passos a um tempo. Por que está me seguindo? - Willard disse, pondo-se no lado contrário pelo qual o homem seguia.
Seu seguidor possuía pouca idade, e vestia roupas pouco nobres. Ele levantou suas mãos assim que viu a suposta adaga empunhada pelo mercante.
- Acalme-se...eu...eu...Você é Sunderly? Meu cunhado falou que você constrói e repara coisas...por um preço menos elevado que outros. Antes que pudesse contatá-lo, soube que abandonou o vilarejo em que vivo...Preciso que construa um bote...com uma vela...preciso chegar a Porto Real. - o jovem falou, intercalando-se entre pequenas pausas.
- Me sinto tentado a ajudá-lo, mas...saiba que só realizo meu trabalho mediante pagamento adiantado.
O possível cliente pensou por alguns instantes, retirando um anel de seu indicador direito. A joia era feita de prata, incrustada com um rubi em seu centro. Pequenos tracejos em cor escarlate traziam certo explendor a ela. O comerciante calçou-a em um de seus dedos e permaneceu pensativo. Antes que ele pudesse concluir seu pensamento, o garoto adiantou-se:
- Ofereço-lhe ainda o cavalo que me fora dado por meu tio. Ele é meio magro e fraco, mas acredito que se tornará uma útil montaria, por algum tempo.
Não arranjara um trabalho havia algumas semanas, portanto, respondeu afirmativanente com sua cabeça.
O vilarejo em que o jovem residia era próximo de uma das margens da Lagoa da Donzela. Ele escolhera um terreno próximo à floresta, o que facilitaria a captação da madeira, essencial para a elaboração do barco e para a restauração das telhas destruídas, fruto de um ataque de selvagens. Seu trabalho começou assim que acordou. A alimentação e uma moradia temporária fora disponibilizada a ele. A comida preparada pela esposa de Zachery, o garoto que o contratara, possuía um sabor divino, próximo ao sobrenatural. Abdicou, porém, de uma possível repetição, o que poderia afetá-lo em seu primeiro dia de construção. Juntamente com Zach, abandonou a estalagem em que o casal residia temporariamente, avançando até seu destino. Um homem, apresentado como pai do contratante, o equipara com um machado, mostrando-lhe, logo após, o melhor local para colher madeira. Will aproximou-se de um dos caules, dispondo-se de seu novo equipanento, e acertou ataques rápidos na direção do resistente tronco. Com bastante dificuldade, talvez pelo recente sedentarismo, levou ao chão uma das árvores. O pai de Zachary colheu o resto do material, alegando ter maior força e habilidade para isso. Acabou aceitando, lembrando-se que fora contratado apenas para construir, e não para gastar suas poucas forças colhendo o que devia ter sido fornecido inicialmente. Já com as tábuas de madeira em mãos, passou a cortá-las e dispô-las sobre o solo. Distribuiu, horizontal e verticalmente,  alguns grossos pedaços de madeira que haviam sobrado, formando um apoio que facilitaria a construção e a movimentação. Os painéis foram furados, levemente, em algumas extremidades superiores, sendo ligados por alguns fios feitos de metal. Já unidos, o casco do barco começou a ganhar forma. Aquilo rendeu certa felicidade ao mercador, mesmo sabendo que não teria tanto lucro quando poderia conseguir. Certificando-se que a altura da quilha não superara o limite, acabou finalizando parte de seu trabalho após cortar as finas estruturas que ligavam as tábuas. A proa acabou sendo finalizada com outros painéis, tornando o bote grande o suficiente para abrigar cerca de 5 homens. Um longo cabo de madeira foi fixado entre a proa e a popa, servindo de apoio a um enorme pedaço triangular de tecido. Aquele formato permitiria navegar mesmo na direção contrária ao vento, o que facilitaria, e muito, a viagem. Para finalizar, Will adicionou uma solução derivada da mistura de água e argila na madeira, o que, segundo alguns relatos de pescadores, solidificava, ainda mais, o casco dos navios. Zach o agradecera fortemente pelo trabalho, mostrando-lhe o garanhão que havia prometido. Apesar de ostentar uma magreza penosa, sabia que ele aguentaria noites consideráveis de viagem. Despedira-se cavalgando pela Estrada do Rei. Sabia que aqueles humildes homens tinham chances escassas de conseguirem chegar vivos a Porto Real, mas não eles não eram mais de sua importáncia. Fizera o seu trabalho corretamente, e era isso que importava.

Habilidade Treinada:

Uma série de longas e escuras nuvens de tempestade cobriu os céus das Terras Fluviais. A chuva pesada, que estava  acompanhada de relâmpagos, trovões e de um forte ventania, havia conseguido atrapalhar meu sono. Um rasco na lateral da barraca, que havia construído com minhas próprias mãos, servira de entrada para o grande acúmulo de gotículas de água. O vento só piorava a situação. Rapidamente, recolho todos os meus pertences e corro na direção da larga estrada responsável por separar as duas extremidades da floresta. Meus passos provocavam quedas regularmente, resultado do contato com o material escorregadio. Uma grande descarga elétrica atinge uma árvore que acaba caindo em minha direção fazendo com eu dispusesse de todas as minhas forças, para conseguir desviar sem sofrer danos. As forças da natureza pioravam ainda mais quando os uivos começaram a impregnar o ar. Uma alcatéia composta por três lobos surge de dentro da floresta, obrigando-me a me dirigir a correr a na direção inversa. Um dos predadores, porém, avançou mais rapidamente, abocanhando minha perna esquerda com extrema facilidade. Os dentes afiados aprofundaram-se sobre minha carne, criando uma horrenda ruptura próxima ao pé. Com a ajuda do outro membro inferior, consigo romper a ligação que tanto me feria. Uma grande quantidade de sangue escorreu até o encontro do chão, ao mesmo tempo em que minha visão embaçava. "Não desmaie, Will! Você consegue!", minha voz tentava, inutilmente, controlar o contínuo fechar de meus olhos. Com grande esforço, uso minhas mãos para arrastar meu corpo, tentando ignorar, a todo momento, a dor lancinante que percorre todo meu corpo. Os lobos avançam lentamente, preparando-se para me atacar no momento em que estivesse mais indefeso. Em um último suspiro, jogo minhas costas na direção do chão. Minha vida seria ceifada pelo simples ataque de alguns animais? Morreria de uma forma tão medíocre? As gotas de chuva que caiam eram rápidas e abundantes, refrescando a parte em que tocavam. Meus olhos, que haviam repousado por alguns segundos, abriram-se e uma confortável visão me fora dada. Um grande represeiro erguia-se alto e gracioso, apesar de estar petrificado. O rosto da árvore-coração parecia triste, onde uma fina linha de seiva sólida escorria de seus olhos, e a única folha que ainda pendia em seus galhos se soltou. Os rosnados estavam tão próximos que o leve tremor dos dentes dos animais já era sentido em minhas pernas e, enfim, o peso de meus olhos não pôde ser aguentado.

Minha perna latejou no exato momento em que meus olhos se abriram. O conforto vindo de minhas costas mostrou-se vir de um grande colchão em que estava deitado. Apesar da dor, um sorriso surgiu em meus lábios. A felicidade de estar vivo. O quarto em que estava no momento, era feito de uma madeira brilhante e parecia oscilar de baixo para cima. Uma bandagem cobria a mordida do lobo e algumas ervas pareciam estar separando-a do contato com minha pele. Ao meu lado esquerdo, havia uma taça com água em seu interior. Com minha locomoção restringida pelo ferimento, acabei derrubando-a. O barulho fora o bastante para que um homem entrasse no recinto. Ele trajava roupas nobres e seu rosto era coberto quase que totalmente por uma barba de cor amarelada. Uma risada rouca preencheu o ambiente com um clima de acolhimento:
- Você é resistente, garoto! Estávamos voltando para nosso barco quando o encontramos. Scott falou que você não sobreviveria, mas vejo que ele estava errado. - a tosse do homem exibiu um aspecto seco - Meu nome é Hubard e sou capitão do Galinha Mercante, o navio em que atualmente está...residindo?
A frase proferida pelo homem havia despertado uma imagem em minha cabeça. Ignorei-a e esgueirei-me pelas paredes até chegar à porta. Ao sair da cabine do capitão, passo por um longo corredor até chegar ao convés. Diversos homens acionam os remos, assim como partem de um lado ao outro para concluir algumas tarefas secundárias. Ao fundo, uma grande fortaleza se ergue majestosa, transmitindo uma sensação de poder e veneração. Uma construção digna de um rei.

Sobre uma mesa do quarto em que residia, espalho as ervas que havia recolhido na área de armazenamento do Galinha Mercante. Hubard levava toneladas de inúmeros materiais, desde tecidos até metais. Em uma de suas expedições às Terras da Tempestade, ele havia recolhido inúmeras plantas derivadas da árvore Dormínea. O intenso número de tempestades acabou gerando uma quantidade abundante deste mesmo vegetal. Apanho uma pequena adaga afiada e diminuo o tamanho das ervas recolhidas com pequenos cortes verticais. O caule e as folhas eram misturados para formar um único produto. Quanto menor o tamanho das mesmas, menos chamariam atenção quando utilizadas com intuitos criminosos. "A maioria dos compradores dessa erva não utilizam-a para seus reais efeitos belignos", pensei. Apenas uma pitada de sonodoce poderia dar um sono sem sonhos para um adulto de peso mediano. Uma número maior de pitadas, porém, acaba por induzir um poderoso sono sem duração determinada. O uso excessivo, por um número maior de dias, pode acarretar em danos permanentes. Após dispo-las em uma pequena tigela, empunho outro objeto, desta vez de madeira, para triturar as plantas com movimentos rápidos e fortes. Adiciono algumas gotas de água na solução, tornando-se mais fácil de atingir um nível perfeito de trituração. Com um pequeno frasco de vidro preparado, o preencho com o resultado obtido: uma grande quantidade de uma substância granulada de uma cor azul-esverdeada. Com minha mão direita, movimento o recipiente sentindo-me feliz pela minha primeira produção de sonodoce. "Isto é apenas o início de algo que pode vir a crescer de forma exorbitante". Com o exemplar já devidamente lacrado, guardo-o dentro do baú que me fora designado durante a viagem.

Auxiliado pelo capitão, movo-me pela embarcação, uma galé rústica de cem remos, enquanto observo o leve movimentar das águas. Já é noite e o convés está deserto. A Lua está estampada nos céus limpos das Terras da Coroa. Um porto é avistado próximo à construção, que, apesar do horário, encontrava-se recheado de inúmeros navios mercantes. A cena parece chocar o homem que me ajuda nos exercícios, fazendo com que este me lance na direção das grossas tábuas de madeira. Um lapso de dor percorreu meu corpo, e, em decorrência do impacto, meu ferimento abria-se novamente.
- Só há uma explicação para o Ostra ter zarpado de Pedra do Dragão e vindo para Porto Real. Ele soube da encomenda de tecidos. Traidor! Espião! Eu percebi a falta de um corvo em meu quarto, mas imagina que alguém de minha tripulação tinha pego. Minha confusão ficava clara em meu rosto, enquanto tentava me arrastar para longe dele. - o capitão permaneceu enfurecido, sacando uma adaga de sua cintura. - Vou mostrar o que um Bolton faria!
Hubert avançou em minha direção, empunhando o aço que portava. Com uma sensação bastante desconfortável em minha perna, consigo me erguer. Com todas minhas forças, tento manter afastada a mão direita dele, iniciando uma longa luta pela vida. O confronto nos fez percorrer todo o convés. Minha ação acabou, por fim, levando-nos ao encontro de uma das muretas do navio. O contato levou a adaga na direção do peito do capitão, perfurando-o de forma profunda. O peso exercido ultrapassou a proteção, puxando nossos corpos na direção do mar. A água fria atingiu meu corpo, entrando em minhas narinas em questão de segundos. Ao abrir meus olhos, percebi a tonalidade vermelha que impregnava a água. Meu nado irregular fez com que minhas costas se chocassem ao casco da embarcação, agarrando-me à pequena escada presente no mesmo. Felizmente, o convés ainda permanecia vazio quando adentrei-o novamente. "O que a tripulação dirá quando notar o desaparecimento do capitão? Preciso pensar em algo". Ainda mancando, apanho um arpão presente no local e perfuro um pequeno  bote utilizado para emergências. Após distribuir inúmeras perfurações em sua base, o lanço na direção do mar. Possivelmente, ele afundaria e poderiam acreditar que o homem havia abandonado seu posto. "Preciso sair desta galé assim que aportarmos. Se descobrirem o que fiz, serei morto". Uma nova imagem surgiu em minha cabeça, que até então, estava guardada em meu subconsciente. Um sonho repleto de objetos e ações aleatórias e estranhamente...profético? Os símbolos, agora, pareciam fazer algum sentido, o que apenas serviu para me confundir e tornar-me ainda mais avesso aos meus sonhos.

Habilidade Treinada: