[RP fechada] A dying star

emasiado lento", ouvi a crítica, mesmo antes de sentir a dor atingir o meu ombro. Ele ignorava as gotas de suor que escorriam da minha testa. Eu mal me conseguia manter em pé. Em todos os trabalhos duros que eu tivera de fazer, eu sempre podia descansar ao menos um pouco. Agora, eu apenas tinha de continuar ali, tentando inutilmente resistir. Eu já estava habituada à dor, mas isso não a tornava menos dolorosa.

Caí no chão exausta, apreciando por breves momentos a frieza do chão, que parecia aliviar temporariamente a dor que sentia. Até que a espada de madeira chocou novamente contra o meu corpo e consegui ouvir uma nova crítica. Ele estava desiludido. Ele esperava mais de mim, depois da forma como eu o conhecera. Ele esperava que eu me esforçasse. Mas eu estava a falhar. Não iria demorar para eu ser expulsa dali. Da minha única casa.

"Chega", ouvi as palavras, achando que era demasiado bom para ser verdade, até que a sua mão firme agarrou na minha, apesar do estado suado em que esta se encontrava. "Estás demasiado cansada para continuar, não vais aprender nada assim. Toma um banho, alimenta-te e volta para aqui". Eu obedeci sem hesitar, como era de esperar. Tinha uma lealdade por aquele homem desde que ele matara a meu pedido, embora não fosse parte do seu contrato. Não que matar fosse algo invulgar para um assassino, mas o que ele fizera libertara-me e eu estava-lhe grata por isso. Respeitava-o, mesmo sabendo o tipo de homem que era.

A água tinha, de facto, um poder curador. Senti-la, aquecida pelo sol, a banhar a minha pele, ajudou-me a relaxar. Deixei que os meus olhos se fechassem por um pouco, sentindo o agradecimento dos meus músculos ao permanecer imóvel. Tinha medo de adormecer ali, mas também tinha medo de sair dali. Eu não estava a passar fome agora, aliás, tinha toda a comida que queria, mas as primeiras semanas estavam a ser duras. Eu queria pensar que, se me esforçasse o suficiente, iria conseguir enfrentar o meu herói, e defender-me a mim própria, conseguir fazer tudo o que pediam de mim para continuar ali. Falhanço após falhanço, porém, as minhas esperanças pareciam não passar disso.

Com o estômago cheio, voltei para continuar a aprender, ou tentar. No lugar onde eu devia encontrar aquele a quem eu interiormente chamava meu mestre — ele deixara claro que não queria que eu lhe chamasse isso, mas não me dera um nome —, estava vazio. Olhei em volta, sem compreender por quê. Ele sempre era pontual. Sentindo um toque frio no meu ombro, virei-me imediatamente para trás sobressaltada. Era apenas ele.

"Por que é que são contratados assassinos quando podem ser usados exércitos? Mesmo que um homem custe o mesmo que um exército.", ele perguntou, a sua voz grave causando-me um arrepio. A pergunta, porém, não era difícil. "Porque são discretos e eficazes. Conseguem se infiltrar facilmente.", respondi, olhando para cima, tentando ver os seus olhos, mas a penumbra engolia toda a sua face. Os meus olhos voltaram rapidamente ao chão. "Correto. A furtividade é uma das grandes qualidades de um assassino. É isso que vais treinar agora. A mover-te com as sombras.", começou por dizer, sem se mover "No mercado, há um joalheiro chamado Malaquo. Ele é constantemente acompanhado por pelo menos dois guardas, mas por vezes mais". À medida que ele falava, senti um remoinho formar-se no meu estômago. As minhas capacidades não tinham sido treinadas. Será que ele esperava mesmo que eu matasse aquele homem?

"O teu objetivo é roubar o anel que ele usa e trazê-lo de volta". Ao ouvir aquelas palavras, soltei o ar que se acumulara nos meus pulmões. Ainda que a tarefa não fosse fácil, não era impossível. "Escolhe a altura em que o farás. O resto do teu dia estará livre, mas espero por ti amanhã com o anel". Assenti com a cabeça, olhando para a porta e começando a arrastar os meus pés na sua direção. Ao lançar um olhar para trás, vi que estava sozinha na sala.

O mercado não era longe, o que apenas piorava a minha situação. Observei de longe o meu alvo, notando imediatamente nos dois guardas com armaduras atrás dele. Não era uma tarefa fácil. Só podia esperar que, à noite, conseguisse me aproximar discretamente deles. Talvez aquilo fosse parte do meu objetivo, observar bem a situação e aprender mais sobre os meus alvos antes de agir.

Só quando a noite começou a cair Malaquo recolheu todos os seus pertences num cofre, entregando-o a um dos guardas, que o carregou enquanto regressavam para a casa do joalheiro. O céu estrelado ia ajudar-me a completar a minha missão. Antes de me mover, olhei bem para os homens armados. Se fosse apanhada, veria aí o fim da própria vida, a escapar por entre os meus dedos como areia?

Mas agora aquela era a minha vida e todos os dias eu estaria a pensar nisso. Se não morresse com uma espada nas entranhas, morreria por um frio que me congelaria os ossos, ou por uma fome que deitaria todo o meu corpo numa combustão sem fim a não ser a morte. Se eu desistisse. Por isso, eu não tinha escolha. A dificuldade para dar o primeiro passo foi a maior, como se estivesse a tentar caminhar num lago, mas logo abandonei esse lago e movi-me.

Usava um chapéu sobre os cabelos negros que pendiam no ar, quase alcançando os meus ombros, que me ajudava a cobrir a cara dos olhares curiosos que me lançaram enquanto eu tentava me aproximar um pouco, mas não demais. Ao adquirir a distância adequada, permiti que os meus pés descansassem minimamente, dando passos lentos e cuidadosos, fazendo o mínimo barulho possível, ainda que as batidas rápidas do meu coração, que inundavam todos os outros sons, me atrapalhassem.

Sentia-me como uma assassina, uma sombra maligna. Talvez um dia fosse mesmo, se não acabasse morta antes. Observei por um momento o chão, onde os meus pés se cruzavam enquanto se movimentavam calmamente, quando um dos guardas olhou para trás. Movi-me um pouco para o centro da rua, para evitar as tochas que haviam em ambas as paredes, não que isso tivesse impacto, eu continuava a ser vista, mas na altura fazia-me sentir mais segura. Na altura, as sombras eram minhas amigas.

Apenas usava umas leves sandálias, que não faziam quase som nenhum. Quase. Porém, ao ver que estava quase sozinha, para além dos meus alvos, removi-as, permitindo que os meus pés se unissem ao chão, não provocando barulho algum. O chão frio foi um choque inicialmente, mas logo me habituei. Até se tornou mais confortável, após algum tempo, mesmo que uma parte do meu calor se dissipasse nas rochas, dava aos meus pés uma sensação de liberdade. Quando Malaquo parou em frente a uma mansão feita de mármore branco, escondi-me numa esquina, observando-o a entrar na casa.

Comecei a dar uma volta ao exterior da casa, que era quase um palácio, deparando-me com uma janela aberta. Era um pouco alta, mas eu conseguia fazer uma pequena escalada até lá. Numa corrida, aproximei-me do palácio até ficar exatamente abaixo da janela aberta, examinando bem a parede antes de a trepar. Coloquei o pé numa saliência, fazendo força com o  pé para me certificar de que estava segura. Repeti o movimento com o outro pé, perdendo todo o apoio que tinha do chão.

Ao entrar no quarto escuro que tinha a janela aberta, olhei cuidadosamente em volta, ainda imóvel. O meu coração recomeçara a acelerar e, no silêncio da casa, era o único som que ouvia, deixando-me ainda mais nervosa. Era a primeira vez que fazia algo assim. Estava numa casa alheia, a deslocar-me pelas sombras. Engoli em seco antes de dar um primeiro passo, mantendo-me na penumbra. Levantava os pés gentilmente, voltando a pousá-los no chão, lentamente, certificando-se de que não fazia um barulho.

Era, porém, difícil avaliar o volume dos meus passos, com o meu coração palpitando. O som da ansiedade. Já estava perto da porta. Estava fechada, mas conseguia ver a luz projetada da outra sala no chão. Repousei a palma da mão na porta, olhando para trás. Na janela, a luz da lua cheia parecia-me acolhedora. Mas isto era algo que eu precisava de fazer. Empurrei lentamente a porta, observando com cuidado a sala para onde estava a entrar. Não vi ninguém e ousei abrir mais e mais a porta, até ter espaço para sair.

Percorri silenciosamente a casa, até encontrar o quarto de Malaquo. Não demorei muito tempo e apenas encontrei, uma vez, uma criada que bocejava. Ela não me viu. Ouvi os seus passos antes de ver a sua figura e escondi-me imediatamente. Já no quarto que eu pretendia encontrar, abri a porta com cuidado, sentindo um aperto no coração quando esta rangeu. Para minha grande felicidade, porém, o homem bronzeado de cabelo preto apenas se moveu um pouco, na enorme cama onde ele e mais duas mulheres se encontravam. Tentei não pensar nisso, focando-me apenas no motivo para ali estar.

Os seus dedos estavam ocultos pelos lençóis de seda, mas na pequena mesa de carvalho ao lado da cama, pude ver o objeto que eu procurava, iluminado pelo luar. Um pé após o outro, aproximei-me sorrateiramente do anel. Ao mesmo tempo que os meus esguios dedos rodearam o metal, ainda quente, eu virei a minha cabeça para olhar para o homem e as suas mulheres, exalando todo o ar que tinha nos pulmões quando vi uma das mulheres a olhar diretamente para mim. Os meus dedos deslizaram pela mesa, quando me afastei até as minhas costas chocarem contra a parede, arrastando o anel. Consegui apanhá-lo antes que caísse e voltei a olhar para a cama. Abri a boca para falar, até me aperceber de que a mulher não se mexera.

Agitei um dedo diretamente à frente dos seus olhos, que não se moveram. Mordi o lábio, fechando a minha mão firmemente. O anel estava seguro. Com ele em minhas mãos, sentia-me oficialmente uma fora-da-lei. Se fosse apanhada, quais seriam as consequências? Iria parar a uma masmorra, ter as minhas mãos cortadas por roubar, ser vendida para me tornar uma escrava? Mas a partir do momento em que eu entrara naquela casa, essa tornara-se uma possibilidade.

Sair da casa não foi um problema. Era tarde e deviam estar todos a dormir. Com o anel reluzindo nos meus dedos, eu rodopiava-o, ponderando no que faria a seguir. Se eu conseguisse vender o objeto, iria conseguir uma boa quantidade de dinheiro. Podia alugar uma cama em alguma estalagem remota e comprar comida para mim mesma. Não ia ter de esforçar o meu corpo ao máximo, como eu fizera durante toda a minha vida. Podia começar a ter uma vida melhor. Eu só pedira àquele homem sombrio para me levar com ele porque era a minha única hipótese para sobreviver. Mas e se estivesse enganada?

Não precisava de voltar à casa com torres que se lançavam aos céus, para todos os dias acordar com os músculos doridos, implorando para que eu não saísse da cama de pedra que me fora dada. Mas quando parei e levantei o olhar, estava em frente a uma casa com duas grandes torres, que se lançavam ao infinito céu estrelado.

Perguntei-me se o homem me estaria a ver. O homem cujo nome eu não sabia. "Nomes são perigosos", ele dissera. Um sorriso misterioso adornava os seus lábios na altura. Era raro vê-lo com um sorriso. Principalmente agora, que eu o desiludia dia após dia. "Esta é a última vez que dizes todo o teu nome." E fora. Eu nunca mais dissera o meu nome.

Quando acordei, a meio de um bocejo, o sol batia na minha face. Ouvi um riso e procurei a sua origem. Observei, admirada, o homem vestido de escarlate que eu ainda chamava de meu herói. Aquela foi a segunda vez que vi o seu sorriso misterioso, brincando entre os seus lábios escarlates.

Habilidade treinada: