[Quest Narrada] Black Sails - Parte 01.

Conhecido por usar o medo para liderar os outros, Kraken tem uma carreira tão notória que outros capitães timidamente recuão assim que mencionam seu nome. Resultado de sua personalidade e das histórias que contam de como ele encontrou o Deus Afogado. Boatos ou não, é fato que correu um evento que ele guarda pra sempre em sua memória. Em uma de suas expedições ele foi jogado no mar e dado como morto. Tendo uma experiência de quase-morte, Kraken passou por um despertar espiritual, e se tornou extremamente leal ao Deus Afogado daí em diante. Tornou-se mais estranho que o normal e a primeira coisa que ele fez foi caçar sua antiga tripulação e os enforcar nas pontes de Pyke. O capitão recrutou uma tripulação fora dos padrões normais dos homens das Ilhas de Ferro, dizem que todos sofreram algum tipo de lavagem cerebral, outros dizem que Kraken apenas achou alguns fanáticos como ele e os ludibriou com histórias. A realidade é que tudo é muito misterioso quando se trata de Kraken e sua tripulação, porém é fato que a lealdade deles é incontestável.

Uma tempestade parecia seguir o Greyjoy desde Pyke, e quando o Terror Voador parou nos Degraus a tempestade parou sobre ele. Não era normal, Kraken sabia disso. Quando finalmente tinham partido em direção à Volantis, o Deus da Tormenta finalmente lançou sua ira sobre o galeão de Kraken. O robusto navio já suportou situações precárias, mas aquela tempestade era anormal. Os duzentos homens do Terror Voador sabiam que estavam presenciando uma luta entre o Deus da Tormenta e o Deus afogado. Sobre o mastro no cesto da gávea um homem gritava em direção aos céus, seus berros impactaram os homens no convés de uma forma não convencional e por um momento Kraken pensou estar bêbado.

Gritos ecoavam pelo mar. A tripulação agitada gritava em direção ao céu, enquanto trabalhavam em seus postos. Era a canção pirata do Terror Voador, que consistia em apenas gritos vindo de todos os lados do convés. Um homem se colocou sobre a borda do navio, ele estava literalmente bêbado e gritava maldições contra o Deus da Tormenta. Quando os homens já estavam roucos, o Capitão voltou a dar as ordens. -Retirar cutelo. - A ordem era dada. O correto seria o retirar quando a tempestade ainda era uma ameaça, porém Kraken era teimoso e só começou a trabalhar para colocar o Terror Voador no caminho, quando o Deus da Tormenta finalmente tinha escarrado sobre o navio. A vela suplementar era arriada para não atrapalhar a manobra da vela principal. A proa mirava as ondas e antes que a vela principal pudesse descer, era necessário deixar a lateral da proa em direção as oscilações.

Os objetos do navio eram amarrados e a bochecha da embarcação -a curvatura do bordo na proximidade da proa- se mantinha em um ângulo de cerca de quarenta e cinco graus em relação às ondas. A manobra diminuía o impacto e criava uma zona calma a barlavento.  O Terror Voador navegava contra as ondas, em uma tática de subir e descer em baixa velocidade, ou seja, as ondas passavam e o navio permanecia praticamente no mesmo lugar. Depois disso foi fácil retomar o caminho à Volantis, porém com a velocidade baixa.

Ao lado de Kraken veio Dentuça, uma das poucas mulheres da tripulação, também uma das descendentes de Korra, dos Dentes de Hag -antigo navio cuja tripulação era de belas e jovens donzelas, que castraram cada homem que capturaram. O capitão agora teria que se preocupar com outra coisa, os olhos de Dentuça o mostravam isso. -Beric convocou uma votação para se eleger como o novo capitão da tripulação. - Dentuça gargalhou após dar a notícia, porém o desdém do capitão a fez ficar em silêncio. Beric era o único da tripulação que não entrou de maneira normal no Terror Voador. Em um saque há cinco anos atrás, Kraken pegou o cozinheiro de um navio Lannister e esse cozinheiro era Beric. Se tornou um homem respeitado pela tripulação, mas não era um homem de ferro.

-Você passou meses mentindo para nós sobre o que caçava verdadeiramente. E agora que é óbvio que não vai dar certo, quer continuar mentindo. - O cozinheiro gritava sobre o convés e sob a chuva. Os homens o escutavam e gargalhadas eram cessadas quando Beric falou sobre mentiras. -Eu ouvi sua conversa, você vai ir sozinho com essa puta para Valíria. - Kraken balançou a cabeça negativamente, tentando entender o que aquele homem queria dizer. -Eu não entendo seu ponto, Beric. Você quer que eu leve todos meus homens para Valíria? Isso não vai acontecer. Você ficou chateado de não saber sobre meus planos desde o início? Você é um cozinheiro. Você virou uma maldita prostituta com medo de viajar sobre o Terror Voador? Nunca te obriguei a ficar aqui. Você quer pegar meu lugar como capitão? Venha pegar! - A expressão de Beric era de puro ódio, ele queria arrancar o coração de Kraken e pendurar sobre o mastro. -É isso que eu vou fazer. Vou tomar seu lugar como capitão e mostrar que você não passa de um psicopata suicida! - A tripulação estava calada, apenas o som da tempestade e dos dois homens discutindo imperava. -Mas quero que saiba, Beric. O que nos espera, você não consegue ver. - A chuva aumentava e a tripulação teria que ir revezando seus postos para se manter no caminho. -E o que seria? - Beric desembainhava sua cimitarra. -Uma guerra. - O Deus da Tempestade cuspia um barulho ameaçador quando Kraken falou. -Valíria não é uma guerra. - Beric zombou, apontando o ápice de sua arma para o capitão. -Não é Valíria que nos espera. - Kraken colocou as mãos para trás, cruzando-as rente ao lombar, por dentro de sua capa negra com uma lula dourada explícita no meio. -Meus antepassados já diziam. Quando um rei nos chama de piratas, ele não quer fazer de nós adversários. Ele não quer fazer de nós criminosos. Ele quer fazer de nós monstros. - De um lado para o outro, os passos aumentavam o ritmo sobre o convés, enquanto o capitão falava. -Pois é só assim que seus fiéis enxergam homens que cuidam do que têm e nada temem. Quando digo que uma guerra se aproxima, não digo minha ida para Valíria. Beric, a civilização é que está vindo, e ela nos quer exterminados. Se quisermos sobreviver, devemos nos unir sob o nosso próprio rei.  

No Terror Voador o roubo é punido com a morte, assim como falsas acusações. O acusado pode se submeter a um julgamento de combate ou a votação da tripulação. As mesmas regras se aplicam quando alguém quer tomar o cargo de capitão. Espadas ou votação. Beric teria de escolher, ele não era burro e sabia que o único jeito de usurpar o cargo de Kraken era ceifando sua vida. O cozinheiro era um homem careca, com cicatrizes sobre a cabeça. Ele portava uma vestimenta branca, porém molhada, enquanto o capitão utilizava uma vestimenta preta com adornos dourados e uma lula dourada estampada no meio da capa que vinha dos ombros aos tornozelos.

Kraken desembainhou sua espada com a mão direita e antes que ele pudesse aumentar a distância entre as silhuetas, Beric deu um pulo erguendo sua cimitarra com uma só mão e descendo mirando o pescoço do capitão. O ferro do Greyjoy subiu, defendendo o primeiro golpe. A cimitarra continuava a subir e descer contra Kraken que se mantinha a defender os golpes com perícia. Um soco veio da mão esquerda do cozinheiro no momento da defesa, fazendo o Greyjoy cuspir sangue. Kraken não queria dar tempo ao inimigo e antes de colocar a cabeça no lugar, avançou com a espada de baixo pra cima, porém o ferro foi barrado e o capitão recebeu um chute no estômago, urrando.

-O grande Kraken! - Beric girou sua cimitarra, zombando do capitão que recuperava o fôlego. O cozinheiro desceu sua arma três vezes, e por sorte o capitão se recompôs. Os golpes eram difíceis de se defender, a chuva atrapalhava. Kraken bateu as costas na escada do convés. Beric desceu sua cimitarra como um trovão na direção do Greyjou que conseguiu rolar a tempo de fazer a arma inimiga riscar o corrimão. Ambos em pé, um rente ao outro o tintilar do aço voltava a imperar. Ataque e defesa, defesa e ataque até Beric rasgar o peito de Kraken em um corte do ombro esquerdo até a costela direita. Não muito profundo, porém o sangue misturado com água tingia o convés de vermelho. Outro golpe com a cimitarra veio em seguida, este desprendeu o tapa-olho do capitão, criando outra cicatriz no lugar onde seu olho esquerdo morava. O corte veio seguido de um chute contra o peito do Greyjoy que foi jogado de costas contra o convés. Beric se abaixou tentou enterrar sua arma na garganta do capitão, que segurou os punhos do cozinheiro presos a empunhadora da cimitarra. A disputa de forças era implacável, Kraken teve que jogar sua cabeça pra esquerda e cortar sua mão na lâmina do inimigo para fazer a cimitarra se prender na madeira do convés. Beric não a conseguiu puxar de volta e um soco o fez rolar para o lado, com o dente quebrado. -Maldito, filho da - Kraken saltou sobre o corpo atordoado do cozinheiro e deformou seu rosto com uma sequência de socos extremamente pesados. Com a cabeça colada no chão, Beric recebia o punho do capitão quase de bom grado, torcendo para morrer logo. Direita, esquerda, direita, direita, esquerda, direita e esquerda, finalmente o cozinheiro tinha sua vida ceifada pelo Kraken.

Tremendo em um estado de frenesi anormal, o capitão se levantou sobre o corpo de Beric. O Greyjoy estava encharcado de sangue, mesmo com a quantia de água que descia do céu. -Amigos... - Kraken tentava controlar sua respiração, enquanto tremia e cambaleava pelo convés. -Irmãos... - Suspirou, olhando para Layla e depois para sua tripulação. -O saque que temos procurado é Valíria. Imenso. Um saque de um valor quase inimaginável. Agora com essa guerra batendo na porta dos infelizes, eles não estão preocupado com nós. Homens de ferro. Filhos do mar. Mas como sempre, quando acabarem de se comer, eles vão focar em nós! Como sempre fizeram! - Kraken rasgou um pedaço de suas vestes e amarrou sobre o olho esquerdo. -Dessa vez não. Depois que eu e minha sobrinha voltarmos de Valíria, nós vamos conquistar o mundo pra vocês! - O capitão jogou o vinho do odre sobre a ferida no peito e estancou com um tecido molhado. -Vamos começar nossa caçada. E vamos ter sucesso. Não importa o custo. Não importa a luta. Vocês não vão ver esse saque comigo, mas vão ver outro. Um maior e mais importante. Esse saque eu verei com vocês. Não vou só torná-los ricos. Não vou só torná-los fortes. Vou tornar vocês os príncipes do Mundo Conhecido! - A tempestade gritava e a luta dos deuses ainda era feroz. O silêncio sobre o Terror Voador era quebrado com os gritos da tripulação em êxtase chamando pelo nome de Kraken.

Alucinações, delírios, incoerência mental... As ruínas de um antigo Kraken foram deixadas no Mar Escondido, meu primeiro declínio me fez reerguer mais forte, sim, porém em minha ascensão ao sudoeste do Mar Oculto, nas Terras das Sombras, não foi apenas um Kraken que renasceu. Sombras de Asshai ainda sussurram em meus ouvidos. Eu já cansei de falar para elas pararem... Nos dias dessa nova geração, pelos mares eu vejo os profetas da água salgada. Nesse dédalo oceano, lugar onde as decisões exigem precaução, onde o poder de decidir esta á se disputar...

Eu deveria dar atenção as vozes famintas de minha tripulação, e não para os demônios em meus ouvidos. Agradeci pelo bom tempo em uma oração dentro da cabine, depois me dirigi ao convés com um odre em mãos. Exatamente como eu esperava, os homens estavam famintos por conta da pouca comida que era distribuída. Eram homens fortes, deviam aguentar até a próxima parada. -Layla, você está no comando. - Minha voz foi precisa, na altura ideal para que as pessoas mais importantes sobre o convés ouvissem.

Voltei para dentro da cabine para refletir. Eu não queria parar, a viagem tinha que seguir sem pausas. Dentro da cabine as vozes voltaram a me atormentar, elas não me deixavam pensar sozinho e instalavam suas maquinações. O que eu deveria fazer? A primeira opção era parar em Volantis e seguir com minha tripulação pelo Caminho do Demônio até Oros, então lá seguir com Layla por um pequeno fragmento de mar até Valíria. Já a segunda opção era passar em Volantis e então atracar em uma pequena ilha do mapa a oeste do Caminho do Demônio, seguindo pela costa com uma pequena galé com Layla até Valíria. Bem, de qualquer forma nós teríamos que parar em Volantis, lá eu decidiria. -Eu sei, eu sei. - Realmente, eu tinha que cuidar da fome de minha tripulação, as vozes me diziam que tinham trazido um presente para mim. Malditos demônios.

No convés, puxei o pedaço de pano que estava sobre o meu antigo olho esquerdo e deixei a cicatriz exposta, afinal Beric tinha me roubado o tapa-olho. Layla parecia me avaliar, eu não poderia culpá-la. Ela sabia que se passava alguma coisa comigo, muitas vezes ela já me pegou conversando com o vento. Os demônios gostam de sussurrar em meu ouvido... mas se não fosse eles eu não teria sobrevivido. Eu criei o hábito de deixar alguém no comando quando eu precisasse resolver algumas coisas... internas, então Layla já estava acostumada com as horas em que fico preso na cabine. Quando as vozes estão muito altas, liderar se torna um ato errôneo, pois nesse momento eu me transformo em um fantoche do Deus Afogado. As vozes estavam altas nesse momento, eu podia perceber que estava explícito em meu olhar minha personalidade desagregada. Quando entro nesse estado em que minha interação com o mundo exterior é nula, somente o sangue sacia minha fome. Não era um bom momento para dar ordens.

Finalmente eu avistei meu presente, lá estava ele, um navio de velas redondas, uma grande embarcação de comércio, com pouco mais de oitenta homens a bordo. Meu galeão com meus duzentos homens iria dizimar os filhos de lys. Bem, eu não poderia tomar a decisão de atacar aquele navio, não agora, apesar de eu querer muito. Layla saberia o que fazer. O mar é um lugar em que um líder não pode ter medo, pois o medo de um líder pra tomar uma decisão, já não o faz mais digno de liderar, não me entenda errado, eu tenho medo das decisões das vozes, não das minhas. Pelos mares os nossos valores são provados, e frente ás provações é muito fácil se corromper. Eu sabia o que Layla iria decidir, afinal ela tinha crescido no mesmo lugar que eu, no campo de batalha. E no campo de batalha nós aprendemos uma lição, é sempre necessário lutar pra se poder obter a glória. Acho que já estava claro a decisão a ser tomada, e bem, eu sou o tipo do cão que morde bem mais do que ladra.