[RP Fechada][Flashback] It's a Bear, isn't it?

– Sabe, a última vez que um Mormont esteve com a face tão colada em um livro, a Ilha foi passada ao segundo da linhagem. – Elyria, naturalmente, odiava ser comparada ao irmão mais velho. Entenda, ela não nutria sentimentos ruins por Duncan, mas sim pelo abandono da Casa Mormont. Apesar de entender que estar na Guarda Real era uma honra, a Jovem Ursa nunca largaria a oportunidade de tomar as rédeas da Ilha. Com a mão direita, silenciou a tutora, suspirando.

Vestida de forma simples, a moça de cabelos trançados lia sobre a história dos Sete Reinos, sempre disposta a aprender cada vez mais, quando a tutora apareceu. Engana-se quem acha que a função da mais velha era sanar as dúvidas da jovem, era tutora de tecelagem, embora essa tarefa não fosse comum na Ilha. Por conta de todos os estereótipos forçados contra as ladys em potencial, julgava-se que as mulheres deviam saber tecer, embora Elyria soubesse que diversas regiões possuíam a cultura guerreira entranhada mesmo na vivência feminina, como era o caso do lar dos Mormont ou até mesmo Pyke, lar dos Greyjoy.

- Não seja tão estraga-prazeres, Odelia. Você sabe que eu nunca negaria a linhagem de meus antepassados. É por isso que estudo.

- Milady, peço perdão se a ofender, mas os lordes não procuram mulheres inteligentes. Para eles, uma fêmea bonita que possa ser exibida ao seu lado e uma boceta apertada é tudo que precisam. – As palavras de Odelia, especialmente as últimas, fizeram a Jovem Ursa corar.

- Daenerys Targaryen foi um grande exemplo de beleza. Os olhos violeta dos Targaryen encantavam, além de seus cabelos brancos terem sido instigantes. Mas isso não é a única coisa que sabemos sobre ela, Odelia. Ela foi a Mãe dos Dragões, Khaleesi dos Dothraki, a Quebradora de Correntes. Você acha que Jon casou com ela pela vagina apertada ou pela pele alva? Jon casou com ela porque ela era inteligente. Dominou povos mesmo sendo tão franzina e tendo voz doce. Dominou dragões. – A mulher não respondeu, o que fez a morena olhar para a direção onde ela deveria estar. - Na verdade, acredito que Jon é que era bastante inteligente por reconhecer que não encontraria outra mulher como ela. - Sorriu para a grisalha, que agora parecia pensar.

A mulher era amarga. Perdera a virgindade cedo, acreditando que seu primeiro amor lhe faria a proposta de casamento, mas ele sumiu assim que se sentiu satisfeito com o sexo que ela lhe deu. Dessa forma, arruinada, ela escolheu o lugar mais longe para onde pudesse ir e se esconder dos olhares acusadores de sua família, e fora assim que viera parar ali na Ilha. Criada como uma nobre, ela não tinha muita experiência em combate, o que fez Elyria adotá-la como tutora, mas seus pensamentos fechados e retrógrados quase faziam a Jovem Ursa dispensá-la.

- É, acho que está certa. Sempre vi Daenerys apenas como esposa de Jon, mas nunca parei para pensar que Jon, na verdade, era o esposo de Daenerys. Ela tem uma história impressionante. - A Mormont riu, indicando a cama para que Odelia se sentasse.

- Maege Mormont nunca ficou atrás de um homem, nem pensar. Ela cumpriu com a lealdade a Robb e lutou bravamente pelo brasão Stark. Mesmo quando perdeu a filha no Casamento Vermelho. - Um arrepio lhe percorreu ao lembrar desse detalhe das histórias. Tantas mortes contabilizadas, a maioria de casas compatriotas... - Filha, por sua vez, que era da guarda pessoal do Rei do Norte, o que também possui um grande significado. - Odelia estava incomodada com a enxurrada de informações, não sabia mais o que dizer. Em seu rosto, a confusão pairava. Elyria argumentava com fervor, procurando em fatos importantes seus meios para fazer que a tutora entendesse que nem sempre o mundo fora preto no branco. Havia sinais cinzentos. Dessa forma, a mais velha levantou-se, alisando o vestido.

- Bem, acredito que seja a hora fe uma pausa para comida. Irei pegar algo que possa alimentar sua mente tão bem quanto o corpo. - Brincou, mas a Mormont mais nova achava que ela apenas tentava interromper o fluxo verborrágico que teimava em escapar dos lábios da Jovem Ursa, interessada em expor seu ponto de vista e disposta a discutir se necessário fosse. Não poderia culpá-la, afinal.

habilidade treinada:

Enquanto esperava por Odelia, a jovem Elyria sorriu de forma inconsciente ao pensar que suas palavras poderiam influenciar a moça. Se assim seguisse, talvez fosse capaz de se tornar grande por meio das palavras, possibilidade que muito lhe agradava. Voltou a pegar o livro que lia antes da interrupção de Odelia, folheando-o em meio à história nortenha, mas não se ateve às palavras, visto que um dos rapazes da cozinha rapidamente adentrara seus aposentos, assustando a nobre, que arremessou o livro contra o recém-chegado sem pensar. O objeto acertou a barriga do jovem, que gemeu, a mão apertando a parte atingida.

- Perdoe-me, milady. Creio não ter sido a entrada mais adequada. - Ele arfou. - Você precisa vir comigo, por favor. - Elyria se recompôs, levantando-se de sua cadeira, ainda desconfiada. Rodrik era fiel aos Mormont, nunca fizera nada de errado, mas homens mudavam suas cabeças com muita facilidade e lealdade podia ser comprada.

- Eu que peço perdão pelo ato impensado. Creio que não ficará com sequelas depois de meu forte ataque, não é mesmo? - Sorriu timidamente, aproximando-se do servo, que saiu dos aposentos da Jovem Ursa sendo seguido pela mesma.


Rodrik a encaminhou ao estábulo, onde uma égua cinzenta relinchava, a dor sendo palpável no som produzido.

- O nosso mestre dos cavalos não está, e acredito que essa égua está em trabalho de parto, mas com dificuldades. Não tenho experiência nenhuma nisso, mas ela já está relinchando há algum tempo e o sangramento está se intensificando. - Elyria observou o animal, o coração em prantos com o som que ele emitia. Aproximou-se com calma, ajoelhando-se perto do rabo da égua, que parecia quase preto, o cinza colorido com o sangue escuro que deixava o corpo dela. Os olhos da Mormont encheram-se de lágrimas, mas não havia muito o que fazer. Precisava colocar aquele filhote para fora logo, ou perderia a mãe também.

- Traga água quente e artemísia. Deve haver no estoque da cozinha. Por favor, não demore, precisarei agir logo. - Assim que Rodrik saiu, a Jovem Ursa fechou os olhos, enquanto apoiava as mãos na anca do animal. Realizou suas preces à Velha, pedindo por orientação nos procedimentos que precisaria realizar, rezando à Mãe em seguida, pedindo perdão pelo potro falecido no corpo da égua. As lágrimas ameaçaram transbordar, mas a Mormont fez um esforço tremendo para engoli-las, passando a tentar tranquilizar a agonia quase física que parecia se abater também sobre a humana. Foi o tempo para que o servo voltasse com uma panela fumegante, os ramos de artemísia presos ao cós da calça.

Elyria retirou as folhinhas do caule, jogando-as na panela, o vapor adquirindo um cheiro característico de chá. Se estivesse certa, aquela planta teria propriedades abortivas, além de acalmar o corpo. Teria que ter uma boa dose, visto que a égua era maior que uma pessoa. Dessa forma, raspou também os raminhos, as lascas misturando-se às folhas para tentar dar uma potência maior à mistura. Esperou que a água ficasse com uma tonalidade mais turva, a mente lhe rasgando com a ansiedade de precisar realizar aquele tipo de receita, além de que o animal parecia relinchar de forma mais fraca agora, talvez abatido pela enorme perda de sangue.

Prendendo a respiração, a Mormont usou da concha que Rodrik havia trazido para administrar a espécie de chá que havia feito, colocando o líquido na boca aberta da égua cinzenta, o servo segurando o maxilar e a língua dela sem que a nobre tivesse solicitado sua ajuda, talvez comovido pelo transtorno emocional que via no rosto da moça. Ao ver que a garganta do animal se mexia, Elyria apressou-se em colocar ainda mais da mistura, tomando o cuidado necessário para que não a afogasse. Passada essa fase, se não surtisse efeito, a jovem teria que apelar.

habilidade treinada:

A Jovem Ursa esperou por algum tempo, mas percebeu que o sofrimento do animal agora se transformava em um leve ressonar. A artemísia em excesso a deixou extremamente relaxada, ao invés de forçar o aborto, o que preocupou a Mormont. Não sabia mais o que fazer. Enterrou o rosto entre as mãos, consternada, ao passo que as mãos do servo lhe apertaram os ombros.

- Não sinto que é uma alternativa que você estaria disposta a tentar, mas ainda podemos livrar a égua de tamanha agonia. - Sem entender o que ele dizia, a moça permaneceu imóvel, o choque por perder uma vida ainda assentando sobre ela. Impaciente, Rodrik continuou. - Lady Elyria, corte-a. Aproveite o efeito relaxante e retire o potro. - A nobre retirou as mãos do rosto, a crueldade de tal alternativa a fazendo se sentir enojada. Virou a cabeça para encarar o rapaz, mas ele mantinha a expressão tão dura que ela não conseguiu sustentar o olhar.

- Você está falando de matá-la, não entende? - O servo balançou a cabeça apenas uma vez, um fio de esperança surgindo em seu olhar, que Elyria não podia ver.

- Ela irá morrer se não receber tal procedimento. Se algo der errado, pelo menos seremos misericordiosos, ao invés de deixá-la sofrendo. - Não estavam falando de algo que a morena já tivesse feito, ela não tinha experiência alguma com cortes. No entanto, tendo em vista a situação, precisava tentar.

- Pegue uma faca mediana na cozinha. Deixe que a lâmina ferva em água, de forma a torná-la limpa. Traga-a logo em seguida para mim. Pegue panos limpos e alhos espremidos misturados à água morna. - Finalizou. O alho possuía propriedades naturais que evitariam a infecção do corte que a moça faria, por isso queria banhar suas mãos nele. Quando notou que Rodrik fora realizar o que lhe era ordenado, Elyria passou a analisar a barriga inchada da égua. Havia uma linha que separava as mamas do lado esquerdo e direito e a nobre considerou que aquele seria o lugar correto após pressioná-lo e ser capaz de sentir a dureza do potro ali dentro. Passando a mão por toda a barriga, procurou sentir a extensão do filhote, para mensurar aproximadamente o tamanho do corte a ser feito, assustando-se com o quanto teria que cortar a mãe, preocupando-se quanto à sua falta de habilidade em abri-la e fechá-la em seguida.

Sem perceber que passara tanto tempo analisando o animal, a Jovem Ursa assustou-se quando Rodrik chegou com o que precisava, entregando-lhe a faca ainda morna, mas suportável devido ao tanto que esfriara com os ventos nortenhos. A Mormont rezou novamente em sua mente, pedindo que suas mãos fossem habilidosas, começando a inserir a lâmina a partir da altura do segundo par de mamas da égua, a pele dela sendo um pouco dura de perfurar. Atentou-se para que a inserção se desse apenas até que pudesse verificar, pelo buraco formado, a negritude do feto apodrecido já ao alcance da visão. Foi cortando, cuidadosamente, até que atingisse o último par de mamas.

- Coloque os panos no chão. Molhe minhas mãos com a mistura de alho e água e busque uma tocha, trazendo-a com cuidado para que não se apague. - Com as mãos esterilizadas, Elyria as enfiou, o rosto contraindo-se com a sensação da carne do animal em sua pele, pelo corte feito, de forma que, para envolver o feto, seus braços também tiveram que ser inseridos até os cotovelos. A fragilidade do filhote abraçado pela jovem quase a fez parar, mas espantou o pensamento e preparou-se para puxá-lo pela incisão. Respirou fundo e aplicou força para que conseguisse extraí-lo, sem muito sucesso. Tentou de novo, não desistindo até que verificasse que pelo menos conseguia mexê-lo, a respiração quase interrompida pelo esforço que fazia, até que o animal veio e a morena se desequilibrou, caindo com ele em seus braços, o que a fez se assustar e jogá-lo para o lado em uma reação instintiva. Logo se arrependeu ao ver o que tinha feito e apanhou o feto, ainda junto do cordão da mãe, com certo nojo e o enrolou nos panos. A ideia era cortar o cordão umbilical e tentar cicatrizá-lo e fechar o corte com queimaduras de lâmina, mas o servo não chegava, enquanto os braços de Elyria estavam sujos de sangue e o sangramento da própria égua se intensificava, ainda pior do que o que lhe ocorria antes. A jovem tentou colocar ambas as mãos para conter o líquido rubro, no desespero para que a vida da mãe não se perdesse, mas era tão nova e inexperiente...


Quando Rodrik chegara, a Mormont estava deitada no lago de sangue da égua, imóvel. Ele a apanhara e levara para que uma das servas a lavasse e vestisse, mas a nobre não expressara reação alguma. A sensação do líquido quente ainda se entranhava em seu corpo, o animal lentamente se perdendo... Por alguns dias, ela apenas conseguiria se lembrar de sua falha. De como a vida era frágil demais para as mãos humanas.

habilidade treinada: